Páginas

29 de março de 2010

Profissão: cuidar do próximo

Conheça a história dos Médicos Sem Fronteiras

Se todos tivessem a chance de escolher as condições ideais de trabalho, certamente privilegiariam aqueles que oferecem as melhores remunerações, as instalações mais confortáveis, bons restaurantes nas proximidades e flexibilidade de horários. Certo? Nem sempre. Em situações de conflito e catástrofes naturais, como recentemente ocorreu no Haiti, acompanhamos a mobilização de milhares de profissionais cujo ofício envolve a privação de qualquer conforto e estabilidade para dedicarem-se integralmente às causas humanitárias.

“A certeza da urgência da necessidade do outro é sem dúvida um elemento importante na motivação pelo trabalho humanitário”, afirma Simone Rocha, diretora executiva da organização Médicos Sem Fronteiras no Brasil. Ela justifica que é por meio da resposta imediata, da doação pessoal e institucional que se espera sanar, curar, apaziguar e melhorar a condição do outro, o que se figura em “retorno incomensurável para o trabalhador humanitário”.

Fundada em 1972 por médicos e jornalistas, a organização francesa sem fins lucrativos Médicos Sem Fronteiras atua em mais de 60 países. São cerca de 28 mil profissionais, das mais diversas áreas, oferecendo assistência à saúde para pessoas cujos países encontram-se em situação de conflito, catástrofes naturais, fome e risco de contágio de doenças ditas ‘negligenciadas’. Ao contrário do que muitos pensam, as pessoas que atuam MSF não estão em missão voluntária. Após sucessivos testes, esses profissionais são contratados e recebem todos os direitos trabalhistas.

Para atuar na MSF – seja no corpo médico ou não – o profissional precisa atender alguns requisitos básicos, como formação em alguma das áreas pré-estabelecidas, fluência em pelo menos uma língua estrangeira e alta capacidade para trabalho em equipe. “Além dos critérios profissionais, buscamos qualidades humanas como adaptabilidade, flexibilidade e capacidade de suportar situações estressantes”, explica Simone. As pessoas que decidem fazer parte dessa ação passam por um processo de reflexão muito grande, no qual muitos vislumbram não o que estão deixando para trás e sim o quão agregadora será a experiência.

O mundo é um moinho

Ao contrário da ideia quase ‘romântica’ que muitas vezes alimentamos acerca da promoção de um mundo mais justo, as motivações das pessoas que encaram o ‘front’ são um tanto quanto realistas. Entendem, cedo ou tarde, que as coisas não são sempre justas e muito menos igualitárias. “Por isso, somos altruístas, sim, mas talvez menos sonhadores do que se possa imaginar. Sonhamos em poder ajudar as pessoas a ultrapassarem os momentos mais críticos de suas vidas, em que sua existência e de seus entes queridos estão ameaçadas por guerras, catástrofes como a do Haiti, epidemias, fome, doenças.”

Mesmo sabendo que não serão capazes de por fim às causas de sofrimento, nada tem um efeito tão apaziguador para o humanitário quanto estar lá no auge da crise. “O mais difícil, para nós, não é estar lá e sim não estar. Assistir à crise do Haiti pela televisão e não poder fazer nada é mais duro para um trabalhador humanitário do que estar lá”, diz Simone, em um relato bonito no qual afirma que em meio à crise e o caos também encontram no outro o que nós humanos temos de melhor a oferecer. “Isso sim nos faz manter a esperança na humanidade e a crença de que o que fazemos vale a pena”.

*Texto originalmente publicado no site Abílio Diniz

0 comentários: